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quarta-feira, 18 de junho de 2025

Serra Talhada e o conflito entre os Pereiras e os Carvalhos: genealogia, poder e território no Sertão pernambucano

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Do final do século XIX até as primeiras três décadas do século XX, a região do Sertão do médio Pajeú, especialmente o município de Serra Talhada, conhecido como Vila Bela, tornou-se cenário de um conflito quase secular entre as famílias Pereira e Carvalho. A exibição de linhagens e emblemas em Vila Bela ajudou a moldar um processo de espacialização das relações de poder, onde os Pereiras representavam uma liderança rural e os Carvalhos, uma liderança urbana. Campo e cidade foram definidos como áreas de conquista e manutenção de domínio. O propósito deste estudo é examinar os conceitos teórico-metodológicos de poder e espacialização, assim como o território como uma categoria espacial essencial para entender o conflito entre as Famílias Pereira e Carvalho na antiga Vila Bela, hoje Serra Talhada, como um relato histórico de espacialização das relações de poder no Brasil do começo do século XX.

As vivências do presente são parte das respostas que emergem ao se questionar o passado. Dessa forma, surgem questões que geram uma série de problemas naturais para o historiador, que busca, no passado, as justificativas para diversos aspectos que formam o seu cotidiano.

No dia 03 de abril de 2014, o Diário de Pernambuco, um dos principais jornais do Estado, apresentava a seguinte manchete: “Faroeste moderno: Conflito familiar é a principal hipótese para a onda de homicídios em Serra Talhada” (Diário de Pernambuco, 03 de abril de 2014). A reportagem mostrava a situação dos homicídios que afetaram a cidade nos primeiros três meses de 2014. Durante esse período, a liderança policial de Pernambuco reportou um total de 18 homicídios no município, o que representou o segundo pior início de ano na história de Serra Talhada, fazendo com que a cidade continuasse a ser associada na mídia com a violência.

Foi na Serra Talhada que reproduziam eventos, por parte de seus criadores, discursos que se pretendiam sertanejos. Eram falas sobre posse, bravura, moralidade, vingança, ostentação de linhagens e emblemas, e especialmente de valorização do espírito de clãs. Esses discursos marcaram minha infância e adolescência, levando-me, na função de historiador, a procurar as razões para uma sociedade tão influenciada por esses elementos, que ajudaram a definir o estigma da valentia do sertanejo, do “cabra macho”, personificado em figuras como Senhor Pereira e Virgulino Ferreira da Silva (o Lampião), entre outros.

Numa tarde uma senhora recebeu a informação por telefone de que um de seus primos, de nome João Pereira de Carvalho, havia sido morto na residência de uma de suas tias.

Uma frase ouvida naquele momento chacoalhou profundamente, foi ela: Eu avisei! Eu avisei que Carvalho não deve se envolver em disputas de Pereira.

Analisando o passado, desenvolvendo essa cultura de maneira científica, a narrativa dos acontecimentos que integram a história do município e da sociedade de Serra Talhada, são muitos os exemplos de famílias que vivenciaram conflitos quase intermináveis no sertão; neste caso específico, referimo-nos a uma rivalidade entre os Pereiras e os Carvalhos, dois clãs que, desde o século XVIII, desempenham o papel de líderes na área do Pajeú, que se situa entre os estados de Pernambuco, Ceará e Paraíba.

Os Carvalhos e os Pereiras, cada um desses grupos familiares, defendiam o que consideravam mais sagrado, como afirmavam, representado por seus nomes, seus brasões, sua honra, sua moral e, principalmente, sua linhagem. A noção de sangue, no sertão, adquiriu um significado mais amplo, justificando o apego desses homens às suas famílias. Além de seu sentido literal, a palavra sangue sugere hereditariedade, ficando ainda mais intensa quando se fazia o gesto de tocar as veias do braço ao se referir a irmãos, primos e pais. Desse modo, qualquer ato que ameaçasse a honra ou a moral de uma família alcançava dimensões imensuráveis, pois a ofensa não atingia apenas uma pessoa, mas alguém que compartilhava o mesmo sangue com seus parentes. Todos sentiam a responsabilidade de preservar o nome da família e buscar justiça.

Estudar o comportamento das pessoas dentro da sociedade, apenas do ponto de vista exterior, observando apenas os gestos e sinais, limitando-se ao que é visível e registrável, "é rejeitar toda uma faceta da realidade social que forma um conjunto de eventos tão autênticos e tangíveis quanto aqueles que podem ser percebidos externamente" (ROCHER, 1976, p. 30). Nesse contexto, a história se torna uma disciplina essencial para entender a estrutura social, pois "todo fenômeno social sempre acontece em um contexto histórico e, além disso, a história é sempre a história de sociedades" (VILA NOVA, 2009, p. 36).

A pesquisa científica sobre a sociedade exige mais do que a simples observação dos fenômenos sociais; ela requer, principalmente, a compreensão através da participação. Os eventos históricos mencionados neste artigo, junto com suas consequências na elaboração de uma análise das relações de poder, resultam da uma experiência direta em Serra Talhada. Não busquei a narrativa dos eventos relacionados ao conflito entre as famílias Pereiras e Carvalhos apenas pela observação dos fatos; sou um descendente direto delas e cresci imerso na intensidade dos laços familiares e sanguíneos, mas, em relação à pesquisa, não serei nem Pereira nem Carvalho, mas sim um pesquisador genealógico autônomo.



Texto de Eugênio Pacelly Alves



Referências bibliográficas:

ROCHER, Guy. Talcott Parsons e a sociologia americana. Trad. Olga Lopes da Cruz. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976.

VILA NOVA, Sebastião. Introdução à Sociologia. – 6. ed. rev. e aum. – São Paulo: Atlas, 2009.

Pereiras x Carvalhos em seu devido lugar . Disponível em: >(https://lampiaoaceso.blogspot.com/2021/10/pereiras-x-carvalhos-em-seu-devido-lugar.html)<. Acesso em 16 de outubro de 2024.

Prenuncio de Uma Guerra Anunciada, Nasce Sinhô Pereira. Disponível em: >(https://cariricangaco.blogspot.com/2010/04/prenuncio-de-uma-guerra-anunciada-nasce.html)<. Acesso em 22 de outubro de 2024.

Brigas entre famílias no Brasil colônia duram até hoje. Disponível em: >(https://cariricangaco.blogspot.com/2016/11/brigas-entre-familias-no-brasil-colonia.html)<. Acesso em 29 de outubro de 2024.

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